Crato, 26 de 08 de 1987.
Caro Amigo Luiz Adão.
O mundo parece não dançar com as danças do mundo. E as minhas pernas em verdade parecem de pau. Meu sono é o de uma velha árvore desfolhada, dessas que não viram pássaros nem sorriso em volta de crianças. Sim, o meu cigarro queima como as florestas do vietnã, embora os dias já tenham enganado o relógio. Meu nome Urano já não é uma rede que me tire das águas pantanosas e o fio dental apenas resseca a minha memória. Não sei que geração me arranha entre os arranha-céus do grande jogo da humanidade. Sinto-me sem afeto e o açúcar perdeu-se nos canaviais. Resta a folha da cana que me corta o estar desperto. E o ribombar incômodo da calmaria cotidiana. Meu pai chega com dois pacotes de tang, o dos astronaustas; da Cooperativa dos Bancários. Enquanto minha mãe lendo uma revista diz que São Cipriano ainda foi bispo. Viveu numa época de perseguição como a nossa. A fita da máquina ainda está boa, respondo a papai.
Com um abraço:
Geraldo Urano
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