sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Poesia de Agora*


1.
ouço as canções
as embriagadas canções da califórnia...

não critiquem de graça
antes se escutem
e Deus nos guarde de janeiro a dezembro da radiação

menina
uma passeata é uma coisa quente
mas não odiamos ninguém

2.
a sabedoria
a meiga sabedoria das mulheres
sabedoria sem palavras...
que se tem ensinado tanto
essa eu canto
como cantaria uma canção
falando de gatos
tenho aprendido muito com os gatos e com o vento

passado
é milho e a galinha já comeu
o vento
aponta o caminho e lá dentro...
uma saudade imensa do futuro

3.
minha nave é meu caminho
e o espaço as estradas do texas
"isso se eu quisesse fazer poesia"

agora
o que eu quero é uma garota
de qualquer nome de qualquer terra de qualquer fé
de cor suiça ou africana ou outra qualquer que queira cantar
__ todo sangue é vermelho
como é vermelha a cruz da "cruz vermelha"
e que esteja vendo
a pomba do futuro desafiando os fuzis...

4.
uma coisa é sonhar
um dia viajar de boeing
outra coisa é pensar
no que vai pelo coração das baleias
em seu coração
sabe que no mundo deles
baleia quer dizer dinheiro
e são capazes de confundir
rodelas de cenoura com moedas de ouro

uma coisa é discutir
a aparência das conservas
outra coisa é sofrer com as vacas o pesadelo das latas

5.
desce a noite sorrindo
na cordilheira de arranha-céus
e nas profundezas
as constelações cintilam
pelo espaço
o vento da cidade
ventando no colorido das saias
amando cabelo e olhares
passou acedendo os meus lábios
e cantam os habitantes
secretamente
a canção da resistência

6.
a lua cheia vagueia no céu de oslo
e nos mares...
lá embaixo os bacalhaus amaldiçoam a noruega

meu bumerangue passeia dentro da noite européia
e vê as filas
para a falsa vitamina dos filmes
a paz arribou de entre os pinheiros
e choram carvalhos e girassóis

7.
falar é bom
não vou estragar complicando
entender é muito saudável
e eu não voi ficar pensando
falo de lugares
porque a lua não é exclusiva de minha cidade
mas como outubro que é de todo ano

8.
a lua
é como outubro como sua roupa atrapalha
se sua roupa soubesse o quanto você é formosa
pediria mil desculpas aos meus olhos

9.
como ia dizendo...
um cara vai por uma estrada
dirigindo sua velha ford guerra
esse cara ingênuo e boa pessoa
como todo mundo também tem seus amigos
ai deus
eles acreditam que todos são amigos
ele vê
o asfalto firme na sua frente
e pelas janelas da camioneta
a plantação crescendo
e diz para o asfalto
__ meu nego está tudo em ordem
ah! mas eu estou sabendo...
ai esse mundo maravilhoso
que nos quer ver mortos

* Poesia de Agora é um livro que reune a produção de dezesseis poetas cearenses, organizado por Carneiro Portela e publicado pela Secretaria de Cultura e Desporto do Estado do Ceará, no ano de 1981. Geraldo Urano é um desses poetas e suas poesias sãos essas acima. Uma nota introdutória o define da seguinte maneira: "Poeta e compositor. Signo de Gêmeos. Nascido no Crato, Cariri-CE, na primeira metade dos anos cinqüenta. Iniciou a sua práxia poética na adolescência. Em 1972 abandonou os estudos 'oficiais' e viajou por vários estados do Brasil. Em 1973, regressou ao Cariri, onde participou do Grupo de Artes Por Exemplo. Participou de várias revistas e jornais literários. Em 1975 expõe objetos redimensionados na transcedência dos símbolos. Participou de 'shows' musicais e inicia uma série de parcerias famosas do Cariri. Revolucionou as tendências musicais da região. Escritor de textos filosóficos e iniciado na magia da natureza. Em 1979 participa do espetáculo 'Canto Cariri' (Teatro José de Alencar), por ocasião do 31º Congresso da SBPC. Tem desenvolvido seus trabalhos musicais com Luiz Carlos Salatiel e Pachelly Jamacaru. Publica alguns poemas na revista Seriará. Mora no Crato. É um dos fundadores do jornal Nação Cariri."

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